Em 1977, a Organização das Nações Unidas (ONU) oficializou o 8 de
Março – Dia Internacional da Mulher. Muito se fala sobre os
acontecimentos que deram origem a esta data. Mulheres russas que
no início do século XX realizaram manifestações por melhores condições de vida
e trabalho e contra a entrada de seu país na Primeira Guerra Mundial. Mulheres estadunidenses que, no final do século XIX, realizaram uma greve por condições
dignas de trabalho e pela igualdade de remuneração com os trabalhadores homens,
tendo sido violentamente reprimidas pela polícia.
A idéia de se definir uma data para dar ampla visibilidade às lutas das
mulheres por seus direitos remonta a mais de um século, tendo surgido na
alvorada do século XX, momento no qual as mulheres lutavam pelo direito ao
trabalho e o direito ao voto. Porém, quando pensamos nas lutas das mulheres, nossa
memória viaja para momentos ainda mais distantes na história, e nos lembramos também
da resistência das mulheres negras ao processo de escravidão no Brasil e às perseguições
sofridas por parteiras, curandeiras e benzedeiras, em razão de seus
conhecimentos tradicionais sobre a arte de curar.
Independente dos fatos históricos que inspiraram a data, o Dia
Internacional da Mulher é um momento de celebração pelas conquistas
alcançadas até aqui – todas, fruto de muita luta...
É também um dia para reflexão
sobre os desafios que ainda se colocam a nossa frente, e com os quais nos
deparamos todos os dias...
Hoje, no Brasil, segundo dados do Instituo Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), as mulheres são pouco mais de 50% da população e
representam cerca de 49% da População Economicamente Ativa. São, em média, mais
escolarizadas que os homens e ocupam, cada vez mais, posições de poder e decisão.
Apesar destes avanços, continuam sendo discriminadas no mercado de trabalho:
recebem remunerações inferiores às dos trabalhadores homens e estão em maior
número nas ocupações informais e precárias, além de serem vítimas do assédio
sexual e moral nos locais de trabalho. Seguem sendo vítimas da violência
doméstica e de violência sexual. Sofrem severos agravos a sua saúde em razão da
forte pressão que vivenciam na busca por conciliar suas responsabilidades no mercado
de trabalho e as atividades domésticas e de cuidado, sem que uma atenção devida
seja dada a este aspecto fundamental da vida em termos de políticas públicas.
Amortecem diretamente o impacto da falta de creches, de escolas públicas com
jornadas integrais, da falta de saneamento. Realizam todo este trabalho de
reprodução da vida de forma invisível e não valorizada. Cuidam das crianças, da
casa, da educação e da alimentação das pessoas, na qualidade de mães, donas de
casa, trabalhadoras domésticas e professoras primárias. Cuidam dos doentes e
idosos na qualidade de filhas, cuidadoras, enfermeiras. Com este trabalho,
garantem que o chamado “mundo produtivo” funcione, tornam possível a reposição
da força de trabalho e o aumento do PIB.
Os obstáculos enfrentados pelas mulheres para terem uma vida digna se
tornam ainda mais profundos quando consideramos as desigualdades baseadas nas
questões étnicas e raciais. Se as mulheres brancas enfrentam enormes desafios
para superar a dinâmica da discriminação de gênero, mulheres negras, mulheres
indígenas e mulheres ciganas enfrentam o desafio adicional de lidarem também e
ao mesmo tempo com a lógica da discriminação racial e étnica. Hoje, no Brasil,
as mulheres ciganas oscilam entre a total invisibilidade e os estereótipos mais
discriminatórios. Sua imagem é divulgada ora de forma extremamente sexualizada,
ora como pessoas manipuladoras e não confiáveis. Temos atualmente neste país um
dos mais respeitados sistemas de estatísticas nacionais da América Latina e não
sabemos dizer quantas mulheres de etnia cigana fazem parte de nossa população. Pouco
se sabe sobre suas necessidades em termos de acesso à educação e formação
profissional, aos documentos de identificação, aos cuidados a sua saúde. Os
dicionários de língua portuguesa de maior circulação no Brasil continuam
divulgando definições pejorativas no verbete cigano, como:
pessoa que faz negócio para burlar; pessoa que tem a arte e graça para captar
as vontades. A partir de pesquisa realizada em uma comunidade de
ciganos no estado da Paraíba, em 1993, um dos mais respeitados pesquisadores
sobre a realidade dos povos ciganos no Brasil, o antropólogo Franz Moonen,
levanta a possibilidade de ocorrência de esterelizações de mulheres ciganas sem
o devido consentimento.
Neste dia tão simbólico e importante para as mulheres, fazemos um
convite à reflexão. Somos mulheres, somos muitas, somos diversas. Somos de
diferentes raças e etnias, de diferentes idades e classes sociais. Temos uma
contribuição enorme a dar para o crescimento e o desenvolvimento de nosso país.
Não aproveitar isso, significa, além de desperdício, falta de visão política e
de estratégia econômica. Significa, de fato, retardar os avanços em direção a
um desenvolvimento sustentável. Para que possamos contribuir para o
desenvolvimento, precisamos ter oportunidades iguais, precisamos ter os nossos
direitos respeitados. Como afirma a filósofa Hannah Arendt, “a essência dos
direitos humanos é o direito de ter direitos”. Para que isso se concretize, é
necessário ter olhos para essa diversidade, visibilizá-la, considerá-la,
reconhecê-la, respeitá-la. Apenas assim poderemos viver em um mundo mais justo
e igualitário.
Celebrar
e refletir...
Homeopatas
dos Pés Descalços homenageia
todas
as mulheres.
Homenageia
também
todos
os homens que lutam pelos direitos das mulheres