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ASSINADO: Dr. S. Hahnemann.

A CARTA
"O delicado engenho humano não foi projetado para o excesso de trabalho. Se algum ser humano assim proceder por ambição, amor ao lucro, ou por qualquer outro motivo pleno de louvor ou de censura, coloca-se em oposição à ordem da Natureza, e sujeita o seu corpo a sofrer dano ou destruição. Tanto mais se o organismo já estiver, por algum motivo, enfraquecido.
Então, meu caro amigo: o que não puderes fazer em uma semana, faze em duas. Teus fregueses podem não estar com paciência para aguardar, mas eles também não podem racionalmente querer que adoeças, ou que morras de tanto trabalhar a fim de satisfazer as vontades deles, transformando tua esposa numa viúva e teus filhos em órfãos. Não é só o aumento do trabalho físico o que está a te prejudicar, mas bem mais a tensão mental concomitante que, por sua vez, novamente afeta o corpo de maneira prejudicial. Se não assumires uma atitude de calma, indiferença, adotando o princípio de viver primeiro para ti mesmo, e só após para os outros, há pouca chance de que te recuperes. Quando estiveres na tua sepultura os homens ainda estarão vestidos, talvez não com tanta elegância, mais ainda toleravelmente bem. Se fores sábio, podes tornar-se saudável e até mesmo atingir uma idade avançada.

Se algo te importuna, ignora-o; se algo te é demais, não te ocupes com isso; se outros tentam manipular o teu tempo, vai devagar e ri dos tolos que queiram te aborrecer. Aquilo que puderes confortavelmente realizar, realiza; não te molestes com o que não puderes fazer, pois as nossas condições materiais não melhoram através da pressão exercida por sobrecarga de trabalho. Tu apenas te desgastarás proporcionalmente mais com teus afazeres domésticos sem aferir qualquer lucro no final.

Economia e limitação de supérfluos (aqueles bens que quem trabalha duro quase sempre não possui) nos coloca em posição de viver com maior conforto - ou seja, de maneira mais racional, mais inteligente, mais de acordo com a Natureza, com mais alegria, maior tranqüilidade e melhor saúde. Por conseguinte devemos agir com mais comedimento, sabedoria e prudência, ao invés de trabalharmos em esbaforida correria, submetendo nossos nervos à constante tensão, que destrói os mais preciosos tesouros da vida: paz no pensamento e boa saúde.

Sê mais prudente, considera a ti mesmo em primeiro lugar e deixa que tudo o mais te seja secundário em importância; e, se porventura afirmarem, em nome da honra, que faz parte de teus compromissos produzires mais do que for bom para o teu potencial físico e mental, mesmo assim, por amor a Deus, não te permitas ser conduzido a fazer o que é contrário ao teu próprio bem-estar.

Permanece surdo à corrupção do elogio, acalma-te e segue teu próprio curso lenta e suavemente, como um homem sadio e sensato. Desfrutar com a mente e corpo tranqüilos, esta é a razão para a qual o homem está no mundo, e para trabalhar somente o tanto necessário para conquistar os meios desse desfrute - e não, com certeza, para se deixar consumir e fatigar pelo trabalho.

O eterno esforço e empenho dos mortais de curta visão a fim de lucrar mais e mais, de assegurar uma honra ou outra, de prestar um serviço a esta ou àquela personalidade -- tudo isso geralmente é fatal ao bem-estar e constitui causa comum de envelhecimento e de morte precoces.

O homem calmo e moderado, que deixa as coisas fluírem suavemente, atinge o mesmo objetivo, vive mais tranqüilo e saudavelmente, e conquista uma boa velhice. Em seus momentos de paz pode haver espaço para acolher uma idéia feliz, fruto de um pensamento sábio e original, que dê um ímpeto lucrativo aos seus afazeres temporais. Lucro bem maior do que pode ser obtido pelo homem sobrecarregado que nunca encontra tempo para concentrar seus pensamentos.

Para vencer a corrida, só velocidade não é suficiente. Empenha-te em permanecer um pouco indiferente, em ser calmo e tranqüilo e então chegarás a ser aquilo que eu desejo que tu sejas. Experimentará coisas maravilhosas; verás quão saudável te tornarás se seguires o meu conselho.

E teu sangue correrá calmo e serenamente em tuas veias, sem esforço ou agitação. Nenhum sonho terrível perturba o sono daquele que se deita para repousar com nervos calmos, e o homem que está livre de preocupações acorda pela manhã sem ansiedade a respeito dos múltiplos afazeres que o aguardam durante o dia.

Para que se preocupar? A alegria da vida lhe é mais importante do que qualquer outra coisa. Com fresco vigor inicia moderadamente teu trabalho e durante tuas refeições nada, nem ebulições de sangue, nem preocupações, nem ansiedade te impeçam de saborear o que o Beneficente Provedor da Vida coloca diante de ti; e assim, um dia se segue a outro em tranqüila sucessão, até que, finalmente, com uma idade avançada, chegues ao término de uma vida bem vivida, e repouses serenamente noutro mundo, como neste calmamente viveste.

Isto não é mais racional, mais sensato? Deixa que os homens insaciáveis e autodestrutivos hajam tão irracional e danosamente contra si mesmos quanto o quiserem; deixa que sejam tolos, mas tu deves ser mais sábio.

Não me deixes revelar esta sabedoria a respeito da vida em vão. Quero-te bem.

Adeus. Segue meu conselho e quando tudo estiver bem contigo, lembre-se do
Dr. S. Hahnemann.
PS: Ainda que te vejas reduzido ao teu último centavo, permaneça alegre e de bom ânimo. A Providência olha por nós e uma boa oportunidade deixa tudo certo de novo. Quanto necessitamos para viver, para restaurar nossas forças com alimentos e líquidos sadios, ou para nos defendermos do frio e do calor? Pouco mais do que coragem. Quando nós a possuímos, podemos obter o essencial sem muito problema. O sábio não necessita senão de pouco. A energia conservada não precisa ser renovada por remédios".

Essa carta foi escrita por volta do ano de 1800, Hahnemann (na época, com 45 anos) recebeu uma carta escrita por um alfaite de 42 anos, que era portador de estrutura orgânica delicada e lhe pedia orientação medicamentosa para se tratar de estafa. Naquela época um profissional daquele ofício geralmente era homem culto e ele recorreu ao auxílio de Hahnemann após ter sido desenganado pelos médicos de sua região. Aparentemente sua consulta não foi em vão: consta que viveu ainda por mais de 50 anos após ter recebido a resposta de Hahnemann.

"Hahnemann viveu 88 anos (1755-1843) numa época onde a esperança de vida era bem mais baixa que os tempos atuais."
Profº Josef Karel Tlach 
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