"Ministério da Saúde
oficialmente extingue o financiamento para os NASFs.”
E foi exatamente o que aconteceu.
Podemos seguramente chamar de ataque ao modelo de atenção primária, que apesar
de sofrido ... estava sendo construído nos últimos anos de forma coletiva, com
participação social. O fim do
financiamento para Equipes de NASF encerra um ciclo de conquistas rumo a
construção da integralidade na saúde. Não se trata de alterar a política para
aprimorar, se trata de financiamento – o dinheiro acima da pessoa. Chamamos a
atenção para as mulheres, crianças e idosos ... só para variar. Os municípios
mais pobres (que já correm o risco de extinção – muitos) não vão conseguir
arcar sozinhos com o financiamento das equipes de NASF (Núcleos de atendimento
a saúde das famílias) e inclusive, alguns já estão informando que terão de
suspender o funcionamento dessas equipe.
Perde o SUS, perde os
trabalhadores, perde a saúde como um todo e principalmente perdem os mais
pobres e necessitados desse país. Para as chamadas minorias étnicas, essas
perderam muito mais.
Quando será que iremos ter um
Humanista na cadeira de ministro da saúde? Por hora, sem vacinas, sem repasse e
sem respeito as participações sociais, sem cumprimento da constituição que
alerta para o direito constitucional a saúde, não conseguimos imaginar o que
mais virá.
AMSK/Brasil
DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO
Publicado em: 13/11/2019 | Edição: 220 | Seção: 1 | Página: 97
Órgão: Ministério da Saúde/Gabinete do Ministro
PORTARIA Nº 2.979, DE 12 DE NOVEMBRO DE 2019
Institui o Programa Previne Brasil, que estabelece novo modelo de financiamento de custeio da Atenção Primária à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, por meio da alteração da Portaria de Consolidação nº 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017.
Carta aberta aos parlamentares, prefeitos e secretários municipais de saúde
Saúde é um direito social e um dever do Estado
As entidades do movimento da reforma sanitária brasileira, signatárias desta carta, reconhecendo a gravidade da crise fiscal e do fraco desempenho da economia, que estrangulam as políticas sociais nos municípios, vêm externar suas preocupações aos parlamentares, prefeitos e secretários municipais de saúde no que diz respeito à proposta de portaria do Ministério da Saúde, que muda os critérios de rateio de recursos federais destinados ao financiamento da atenção primária em saúde.
Tal proposta está alinhada com a política de austeridade fiscal, que, a partir de 2016, introduziu um teto para as despesas primárias, por meio da Emenda Constitucional 95, que vem reduzindo o piso do governo federal em termos reais per capita das ações e serviços públicos de saúde. Esse arrocho se torna mais grave com as recentes propostas apresentadas pelo poder executivo, que visam, a um só tempo, reduzir o teto dos gastos, eliminar o mínimo da saúde na união, estados e municípios e colocar a saúde e a educação numa disputa fratricida – que certamente agravam as condições epidemiológicas, ampliam a desigualdade de acesso e não corrigem os vazios assistenciais.
Neste quadro, sendo a atenção primária uma pedra fundamental da arquitetura da universalidade, integralidade, equidade e participação social do Sistema Único de Saúde (SUS), qualquer alteração no seu financiamento e na sua organização, em especial se ameaça sua sustentabilidade econômica no curto prazo, deve ser submetida para aprovação do Conselho Nacional de Saúde nos termos da Lei complementar 141/2012, mas antes amplamente discutida com o Congresso Nacional e com os conselhos municipais, estaduais e nacional de saúde – que contam com a presença de gestores, prestadores, trabalhadores e usuários –, garantindo a participação da comunidade e de seus representantes no poder legislativo, dentro do espírito democrático que deve prevalecer e orientar o funcionamento de sociedades que tem os direitos de cidadania como valor.
Até recentemente, sem uma proposta objetiva e transparente, o debate foi insuficiente e limitado aos círculos da burocracia nas três esferas de governo, impedindo o exame e a crítica do controle social e da comunidade científica. As mudanças propostas podem, de forma silenciosa, romper com o pacto de solidariedade que fundamentou o modelo de proteção social à saúde, criado na Constituição de 1988. Três aspectos, em especial, podem afetar negativamente as condições de vida e saúde do povo brasileiro, que já enfrenta o retorno de doenças evitáveis e a proliferação das arboviroses, no contexto da tripla carga das doenças (infecciosas, crônicas e causas externas):
(I) a definição do rateio de recursos federais a partir da “pessoa cadastrada” rompe com o princípio da saúde como direito de todas as pessoas e inviabiliza a aplicação de recursos públicos segundo as necessidades de saúde da população nos territórios, o que permitiria dimensionar melhor as desigualdades relativas às condições demográficas, epidemiológicas, socioeconômicas e geográficas dos municípios, conforme preconiza a Lei 141/2012. Essa Lei reforça a norma constitucional que consagra a política de saúde enquanto direito social, em sentido oposto a proposta de focalização do Banco Mundial, que norteará as mudanças na atenção primária, produzindo consequências indesejáveis sobre a desigualdade de acesso, sobretudo, nas principais regiões metropolitanas;
(II) considerando que o SUS é subfinanciado e por isso sua gestão encontra dificuldade para se aperfeiçoar, apesar da política de austeridade fiscal, não se pode pensar em diminuição de recursos, seja o ano que for e em qualquer área do Ministério da Saúde. Os “incentivos” econômicos oferecidos para 2020 aos gestores comprometidos com a construção do SUS na fase de transição para implantar as mudanças no financiamento da atenção primária são ilusórios. Há mais de uma década, os municípios estão sobrecarregados e não suportarão nenhuma restrição financeira, fato que violaria o princípio do não retrocesso no custeio dos direitos fundamentais. Além disto, o pacto federativo brasileiro requer ação solidária entre os três entes do governo para o cumprimento das responsabilidades do Estado com a saúde da população. Às vésperas das eleições municipais de 2020, não é justo impor aos profissionais do SUS nos municípios sobrecarga ainda maior de trabalho para operacionalizar as mudanças da portaria, sem que os problemas reais da gestão sejam de fato considerados e equacionados. Considerando a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, o teto dos gastos sociais e a portaria 233 da Secretaria do Tesouro Nacional – STN, que incorpora das despesas com pessoal das organizações sociais desreguladas, o repasse do Piso da Atenção Básica – PAB fixo torna-se fundamental e inegociável, atacando brutalmente os cuidados primários na base e a organização do sistema universal;
(III) essa proposta descaracteriza completamente a Estratégia de Saúde Família – ESF, cuja resolutividade garantiu a redução das taxas de mortalidade infantil, das internações por condições sensíveis à atenção primária à saúde e dos gastos
hospitalares, além de aumentar da cobertura pré-natal. O Ministério da Saúde prioriza o Programa Saúde na Hora, que reduz a equipe multiprofissional da ESF e valoriza o modelo biomédico de cuidado fragmentado, correndo-se o risco de organizar as unidades básicas de saúde a partir da lógica das unidades de pronto atendimento. Na mesma linha, prioriza a delimitação de uma carteira de serviços, que transforma a atenção primária em atenção focalizada, uma infâmia que legitima um “SUS para pobres”, um retrocesso em relação ao princípio de integralidade e aos avanços decorrentes da ESF adotada no Brasil, documentados pelos estudos já realizados por organizações internacionais e nacionais sobre o tema.
Nesse sentido, estamos alertando, em caráter de urgência, parlamentares, prefeitos e secretários municipais de saúde sobre os efeitos deletérios dessa nova modalidade de financiamento da APS e conclamamos todos a garantir a discussão desta portaria no Congresso Nacional e nos conselhos de saúde do todo o país, para que a sociedade possa se expressar legitimamente, fortalecendo o diálogo democrático entre o Estado e a sociedade, na perspectiva de defender um SUS público e de qualidade para todos os brasileiros.
Salvador, 8 de novembro de 2019
Associação Brasileira de Economia da Saúde – ABrES Associação Brasileira de Enfermagem – ABEN Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia – ABMMD Associação Brasileira da Rede Unida – REDE UNIDA Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO Associação Nacional de Pós-Graduandos – ANPG Associação Paulista de Saúde Pública – APSP Centro Brasileiro de Estudos de Saúde – CEBES Federação Nacional dos Farmacêuticos - FENAFAR Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares – RNMMP Sindicato dos Trabalhadores da Fiocruz – ASFOC-SN Sociedade Brasileira de Bioética – SBB