Pois é; você descansou Mandela;
Junto com você, vai surgindo um sentimento quase
desesperador, daqueles que não sabemos explicar...as pernas ficam moles e
dizemos; como assim???
Daí a gente senta e começa a ver nos noticiários as falas de
líderes, o choro e a dança do país de origem, as bandeiras a meio mastro e as
falas ... as falas são incômodas e são muitas. São terríveis e fazem com que a
gente forme uma opinião de banalização horrível. Tudo era tranqüilo no país das
maravilhas... ou ainda a mais famosa delas; nos juntamos a todos os órfãos de Mandela. Quem
dera fosse infimamente verdade.
Pronto; será assim:
Serão dadas honras de chefe de estado, mas essas honrarias são ao homem de pele negra que ousou sonhar e
fazer desse sonho uma realidade muito acima de sua cor de pele. Você chefiou
nações de corações humanos, nações de pessoas sozinhas que não sabiam e não
tinham a mínima idéia do que era respirar.
Salvador da pátria. Esquecem de dizer que em todas as nações que possuem ouvidos e coração,
você resgatou dignidades, você salvou gerações muito além do seu território.
Um grande estadista. O maior de seu tempo, superior a reis e rainhas, chefes de grandes potencias
e gente de estirpe. Sendo você mesmo e sendo simples assim.
Confesso a você que me sufoca e me irrita muito o mundo se
arvorar em enviar gerações de representantes de governos para as fotos
fúnebres. Você ainda é maior que as fotos
que foram tiradas.
Você trouxe e trás o sentido perigoso de calmaria e a certeza
do caminho, aquela que afugenta imperadores e mata leões. Você ainda rompe o
grito do bruto que por não ter o domínio do ideal e do caráter, apela para o
medo e o horror das armas, você estampa a vergonha alheia de todos eles, pelo
simples fato de ainda existir. Não puderam matá-lo e ainda não o podem.
Então penso; será que sentirão vergonha? Será que
conseguirão suportar o peso da mediocridade em suas pernas enquanto as honras e
cerimônias acontecem?
Você descansou fisicamente, fechou os olhos, para atravessar
os vales e as planícies de sua existência de forma impar e como muito poucos o
fazem. Tomara que sirva de exemplo para muitos; além e muito além de palavras.
Detrás da cela, você alimentou um exercito de pessoas apenas
com o silêncio que a convicção verdadeira pode dar. Para quem não pode agir,
resta à revolta, mas para você, restou a meta, o ideal e a convicção de que era
possível ... e foi.
Tenho a certeza de que hoje, você leva consigo a dança e os
tambores, mas que não passará nem perto das cerimônias ... não há redenção aos
que ficam, apenas para os que souberam sentir o medo, mas continuaram. Das pedras
manchadas e sujas que recebeu, você entrega a reluzente jóia negra, o límpido e
bruto diamante negro, que mesmo tendo a força de cortar e rasgar a carne e o
tempo, prefere reluzir a leveza da força e a clareza da imensidão.
Vá em paz senhor Mandela, pois nunca nos conhecemos, mas
sempre nos respeitamos e amamos os mesmos arvoredos e as mesmas ruas.
Seria muito mais fácil, convocar o mundo e a África para a guerra
... e vocês ganhariam, assim como é mais fácil bater do que apanhar; mas você
soube simplesmente SER.
Confesso que desejo o tempo inquieto para que façamos o
exercício de SER, além da podridão do estado, além da corrupção que suga a alma
das ainda crianças. Espero que os governantes se envergonhem de pisar onde você
pisou e reflitam que o mundo é muito além de seus umbigos e de suas restritas
estaturas.
O modelo vago da paz, pode ser usado para nortear seu nome,
como o foi para Gandhi, Luter King e Tereza. Vão tentar dependurar seu retrato
no hall de pessoas ditas ilustres e muitos tentarão se comparar a você. Você sabe
disso, sempre soube disso não é? Mas é aí que você não se enquadra, como os
outros também não se ambientam: os olhos, os mesmos olhos que gritam por paz,
os olhos de muitas nações e de muitas cores, os olhos que viram sangue, água e
azeite e que continuam abertos, mesmo que os anos ou os homens continuem querendo
fechá-los.
Até qualquer dia, nós continuamos por aqui e espero que
sejamos muitos os que ainda mantenham a capacidade de se indignar.
Adeus - Devlesa
Homeopatas dos Pés Descalços